segunda-feira, 27 de outubro de 2014

‘Carro que voa’ busca marco regulatório

27/10/2014 - O Estado de SP / The Washington Post

HAYLEY TSUKAYAMA - THE WASHINGTON POST

Sejamos sinceros: já é 2014, e a indústria automobilística desapontou completamente uma geração de amantes da ficção científica. Onde estão os carros voadores? Quem tenta preencher esse vazio é a Terrafugia, que se descreve como "a empresa dos carros voadores". Ela anunciou o futuro lançamento do modelo "Transition", com asas dobráveis que permitem ao veículo fazer a conversão de carro para avião em cerca de 20 segundos ao pressionar de um botão. Isso é que é conversível.

É preciso reconhecer que o Terrafugia Transition não será exatamente o carro voador à moda dos Jetsons, como muitos sonham. Mais correto seria descrever o Terrafugia Transition como um avião que pode ser dirigido, e não um carro que pode voar. Infelizmente, isso significa que não será possível escapar voando de um congestionamento. Embora seja improvável que a combinação carro/avião substitua a minivan, a empresa tenta definir um padrão para que o novo veículo possa ser classificado pelas autoridades regulatórias americanas.

"Trata-se de um primeiro passo prático", disse o diretor executivo da Terrafugia, Carl Dietrich. "É o que podemos fazer com a infraestrutura existente." Do ponto de vista regulatório, a Terrafugia incorporou medidas de segurança exigidas tanto pela Administração Federal da Aviação quanto pela Administração Nacional de Segurança no Tráfego das Estradas.

Assim, o Transition tem tanto paraquedas quanto airbag. Para compensar a ausência de um para-brisa traseiro, o Transition tem uma câmera, permitindo que os motoristas vejam o que há atrás deles por meio de uma tela no painel. Afinal, ninguém quer se envolver numa fechada acidental com um avião. O veículo tem tudo que se esperaria de um carro, como cintos de segurança e espelhos retrovisores laterais que conseguem ver além das imensas asas em modo carro e podem ser removidos durante o voo.

Complicações.Apesar de ter autorização para rodar nas pistas (com as asas erguidas) o Transition não é exatamente aquilo que chamaríamos de veículo para todos os usos. Para usar tanto a função de carro quanto a de avião, é preciso ter um brevê de piloto esportivo - mas, para quem pensa em gastar cerca de US$ 279 mil num veículo, isso não deve ser um empecilho.

Também será necessária uma pista de decolagem: o Transition precisa de bastante espaço para decolar, algo que se torna possível a partir da velocidade de 115 km/h. E essa pista de decolagem não pode ser escolhida a esmo, porque ninguém chega no Aeroporto Nacional Reagan ou no Aeroporto O'Hare, em Chicago, na esperança de encontrar "vaga". Os donos do novo carro deverão um dos 5 mil aeroportos regionais espalhados pelos Estados Unidos.

Os donos do novo veículo não precisarão, porém, ter seu próprio hangar. Com as asas dobradas, o Transition não é muito maior do que um Cadillac Escalade ou um Ford F-350, dizem executivos da Terrafugia. Com isso, o veículo deve caber numa garagem comum. Além disso, o combustível usado é a gasolina premium, com rendimento de quase 15 km por litro no solo. Em voo, esse rendimento é um pouco menor - cerca de 8,5 km por litro ao viajar a 160km/h.

O veículo tem um volante para a pilotagem no chão, que pode ser trocada por um manche para os voos. Há quatro pedais no chão: acelerador e freio, e dois para controlar o leme. Para o futuro, a Terrafugia está planejando um carro voador que vai dispensar a pista de decolagem - mas, para isso, será preciso esperar um pouco. O processo de desenvolvimento do modelo, batizado de TF-X, deve consumir de 8 a 12 anos.

O futuro dos Jetsons, que imaginou um carro voador na garagem de cada família, passava-se em 2062. Para quem quer atuar neste setor, o relógio está fazendo tique-taque. 

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Peugeot e Embraer desenvolvem carro com material sustentável

21/10/2014 - Valor Econômico

Um laboratório voltado para o desenvolvimento de materiais sustentáveis para interiores de aeronaves foi o pontapé inicial para a construção do 208 natural, carro conceito resultante de uma parceria entre a Embraer e a PSA Peugeot Citroën. O resultado será apresentado no Salão Internacional do Automóvel de São Paulo 2014, que acontece entre 30 de outubro e 4 de novembro.

O carro foi concebido pelo Centro de Estilo da PSA na América Latina, e contou com a participação de mais de 200 profissionais multidisciplinares de 20 empresas instaladas no Brasil. "Este carro é uma homenagem ao Brasil. Seu conceito é 100% brasileiro, pois utiliza fontes sustentáveis trabalhadas localmente", diz o gerente de Estilo de Cores e Materiais da PSA para América Latina, responsável por todas as fase de desenvolvimento e produção, Fabien Darche.

Com cerca de 68 quilos de material sustentável, o 208 Natural possui rodas de alumínio de 17 polegadas que receberam um tratamento de superfície conhecido como "anodine", aplicado nas partes externas das aeronaves. O banho de anodine, segundo Darche, além de deixar o material mais resistente, torna o alumínio menos permeável ao ar, garantindo melhora no consumo de combustível.

O monograma aplicado na parte traseira do carro tem desenho inspirado no pau-brasil, árvore que é parte do projeto de reflorestamento promovido pela Peugeot na Fazenda São Nicolau. A peça, segundo a montadora, foi produzida na base de uma chapa laminada de bambu e recortada com tecnologia a laser.

No interior do carro, um dos destaques é o para-sol em jornal reciclado transformado em um material parecido com madeira. Darche ressalta que o trabalho foi desenvolvido em parceria com um grupo de artesãos do projeto social Rede Asta, do Rio de Janeiro. A peça recebeu uma selagem transparente para garantir mais proteção ao produto final.

O couro de Pirarucu, um dos maiores peixes de água-doce do mundo, originário da Amazônia, deixou de ser privilégio do mundo da moda no país. O material, na cor marrom, foi aplicado de maneira decorativa nos bancos do carro, além de revestir detalhes do painel de instrumentos e os apoios dos braços das portas. O couro de salmão foi utilizado no freio de mão e na alavanca de câmbio.

A parte interna do teto foi revestida em cortiça tingida na cor salin. Por suas propriedades térmicas e acústicas, a cortiça foi utilizada por ser excelente isolante. Os tapetes do carro usam um misto de elementos, como silicone, cortiça, couro bovino natural e o laminado de bambu tingido.

O carro impressionou a matriz da Peugeot e a parceira com a Embraer deve prosseguir. "Já temos discussões sobre a continuidade da parceria, pois o objetivo é juntar forças que possam ser aplicadas em soluções globais para a indústria automotiva e aeronáutica", ressaltou Frederico Battaglia, diretor de marketing da Peugeot no Brasil.

Para a Embraer, o benefício da parceria, segundo o vice-presidente de Relações Institucionais e Sustentabilidade, Nelson Salgado, é o complemento das pesquisas desenvolvidas pela empresa, através da utilização prática dos materiais no carro conceito. O intercâmbio de conhecimentos e de profissionais entre a indústria aeroespacial e automobilística, de acordo com o executivo, sempre existiu, mas é a primeira vez que se faz o desenvolvimento conjunto de um carro-conceito.

A maioria dos materiais utilizados no carro saiu do laboratório de desenvolvimento de conceitos de materiais da Embraer. O laboratório tem a função de estimular a cultura de exploração de materiais de baixo impacto ambiental (metais, cerâmicas, polímeros, produtos têxteis e compósitos) ainda não disponíveis no mercado.

"Não temos conhecimento de nenhuma outra biblioteca de materiais naturais tão completa quanto a nossa", disse. As pesquisas da empresa com materiais sustentáveis para interiores de avião começaram em 2007, como oportunidade para usar elementos nacionais no interior dos jatos executivos. Os materiais utilizados no 208 Natural ainda não foram aplicados nos aviões, mas podem ser empregados nas futuras gerações de aeronaves.

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Aerocarros a caminho

04/10/2014 - Revista Planeta


Nas primeiras décadas do século XX, ter um automóvel era sinônimo de liberdade para ir aonde se quisesse, numa época em que poucas pessoas podiam se dar a esse luxo. Um século depois, a indústria automobilística é uma potência global, ter carro é corriqueiro e só a cidade de São Paulo, com 11 milhões de habitantes, possui 7 milhões de veículos registrados.

Com uma frota dessas não há melhoria no transporte coletivo urbano que dê conta de destravar o trânsito como nos velhos tempos. Daí a projeção de um outro sonho, restrito novamente a privilegiados: ter um veículo que trafegue por terra e ar, passível de ser guardado na garagem e decolar ou pousar sem necessidade de pistas. Em termos de sonho, não chegamos à era da família Jetson, mas estamos a caminho.

"O benefício potencial de um carro voador prático é tremendo. Pelo menos 6% dos americanos desejam um, 19 milhões de pessoas", afirma Carl Dietrich, presidente da empresa americana Terrafugia. Baseada em Massachusetts, a companhia está na dianteira do setor com o aerocarro Transition, criado em 2006, considerado apto para trafegar nos EUA, no ano passado, tanto pela Federal Aviation Administration quanto pela National Highway Traffic Safety Administration.

O Transition chegará ao mercado em 2015 depois de mais testes. O veículo ainda exige pista curta para decolar, mas possui asas dobráveis e pode ser guardado na garagem. O conceito pressupõe rodar até um aeroporto, decolar (com um piloto e um passageiro), atingir 185 km/h de velocidade no ar e voar até mil quilômetros usando gasolina de 91 octanas (equivalente à gasolina premium brasileira). O preço, US$ 300 mil, equivale ao de um Cessna 172, o avião pequeno mais popular do mundo. O custo não chega a ser empecilho para os atuais 100 privilegiados da sua lista de pedidos.

Enquanto o Transition está sendo preparado para a estreia nos EUA – já que nenhum outro país autorizou seu uso –, a Terrafugia já planeja outra novidade avançada: o TF-X, um aerocarro híbrido dotado de asas e hélices dobráveis, desenhado para quatro pessoas (piloto e três passageiros). Seus atrativos são a simplicidade no manuseio e a facilidade para decolar verticalmente, como um helicóptero. Em voo, as hélices são recolhidas e um motor de 300 hp propulsiona o aparelho, que atinge a velocidade de até 320 km/h. O veículo deverá atender a preocupações especiais com segurança, como paraquedas de emergência e sensores automáticos para evitar tráfego aéreo, mau tempo e espaços restritos a aeronaves maiores. Mas ainda deverá enfrentar uma bateria de testes rigorosos e problemas regulatórios.

Segundo Dietrich, "aprender a operar o TF-X com segurança não tomará mais de cinco horas de um motorista mediano". Prevê-se que o projeto fique pronto em 2025, a um preço unitário "comparável ao dos mais luxuosos carros atuais", promete o executivo.

Mercado lento

Quem está mais próximo da Terrafugia no novo mercado é a PAL-V, da Holanda, que planeja lançar um carro-helicóptero em 2016. O modelo PAL-V One, com hélices dobráveis, pode levar o piloto e um passageiro à velocidade de 180 km/h tanto no ar quanto em terra, com autonomia de combustível para voar 500 km e rodar 1.200 km. O preço calculado é indigesto: 500 mil euros (cerca de US$ 676 mil). Apenas 45 unidades deverão ser postas inicialmente à venda.

"Não esperamos vender milhões, levará tempo para desenvolver esse mercado", afirma o engenheiro- chefe Mike Stekelenburg. A aposta é comercializar 600 veículos por ano, por enquanto. Terrafugia e PAL-V investem num mercado que ainda não dispõe de regulação. Por enquanto, os projetos de aparelhos aparecem em peças publicitárias, voando sobre cidades ou campos verdejantes. Mas como seria se milhares de veículos desse tipo viajassem ao mesmo tempo rumo a um estádio de futebol ou um shopping center? Como organizar esse tráfego? Os pilotos precisarão de carteira de motorista e de brevê?

Normas estritas do trânsito e de pilotagem terão de ser estabelecidas. Nesse sentido, cinco instituições de pesquisa da Inglaterra, Suíça e Alemanha já estão trabalhando no projeto myCopter, que conta com um subsídio de US$ 4,7 milhões da União Europeia: Universidade de Liverpool, Escola Politécnica Federal de Lausanne, Instituto Federal Suíço de Tecnologia de Zurique, Instituto Max Planck de Biologia Cibernética e Instituto de Tecnologia de Karlsruhe.

O objetivo da iniciativa conjunta é estudar o ambiente de voo e preparar os indivíduos para conduzir os aparelhos, tornando a pilotagem o mais fácil possível. Para tanto, as instituições criaram simuladores e veículos aéreos de teste em terceira dimensão. Os resultados obtidos ajudarão a aprimorar a interface homem-máquina e compreender os problemas regulatórios, além de favorecer o surgimento de melhorias técnicas nas aeronaves.

"Nosso objetivo é desenvolver tecnologias que poderão ser usadas para formatar um novo sistema de transporte para viagens pessoais, na verdade uma nova modalidade de tráfego, levando em conta a expectativa dos usuários e a reação do público", sintetiza Heinrich Bülthoff , do Instituto Max Planck. Dadas as condições precárias do trânsito em muitas cidades, doses extremas de cautela serão necessárias.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Brasil perde posição em ranking de carros

07/08/2014 - Valor Econômico / The Wall Street Journal

 A crise atravessada pela indústria automobilística se expressa não apenas em paradas de fábricas ou cortes de vagas de trabalho, mas também na perda do status ostentado pelo Brasil em rankings globais do setor. Além de perder para a Alemanha a quarta colocação entre os maiores mercados automotivos do mundo, o país foi ultrapassado pelo México entre os grandes produtores de veículos.

De janeiro a julho, o México produziu 38,5 mil veículos a mais do que o Brasil, que, dessa forma, cai para o oitavo lugar na lista dos principais centros de produção de automóveis do mundo. Já na lista dos grandes mercados automotivos, a Alemanha agora está pouco mais de 33 mil veículos à frente do consumo brasileiro. Em junho, os alemães já tinham recuperado a quarta colocação perdida há quatro anos (veja gráfico).

Se a queda nas vendas é atribuída a questões como retirada de estímulos, restrições de crédito e maior endividamento das famílias, a perda de posição no ranking da produção, além do cenário doméstico, se deve à falta de competitividade das montadoras brasileiras para acessar novos mercados internacionais.

Enquanto o Brasil depende quase que exclusivamente da demanda da Argentina - hoje em crise - para melhorar suas exportações, o México tem sua produção atrelada à recuperação do mercado nos Estados Unidos, com quem tem um acordo de livre comércio. Como resultado, o Brasil, mesmo tendo um mercado interno maior, está atrás na produção não apenas do México, mas também de Coreia e Índia.

Neste ano, com a derrocada no consumo argentino - destino de praticamente quatro em cada cinco carros embarcados por montadoras daqui -, as exportações de veículos produzidos no Brasil recuam mais de 35%. Quando se soma isso à queda de 8,6% no consumo interno o resultado é queda superior a 17% da produção, como mostram os resultados divulgados ontem pela Anfavea, entidade das montadoras instaladas no país.

Já no México, o mercado doméstico está praticamente estagnado - o que também afeta o Brasil, uma vez que o país é o segundo destino dos carros brasileiros. A recuperação americana permitiu, porém, que as montadoras mexicanas aumentassem a produção em 7,5%. Pouco mais de 83% dos veículos produzidos no México vão para o exterior.

Só os Estados Unidos absorveram 71,5% das exportações de veículos mexicanos e, neste ano, estão ampliando em quase 20% as importações dos automóveis de seu parceiro no Nafta. Já o Canadá, o outro aliado no bloco de livre comércio da América do Norte, absorve pouco mais de 9% das exportações de carros do México, de onde está comprando 22% a mais.

Empresários de montadoras brasileiras dizem que, não bastasse o acesso a grandes mercados, o México leva vantagem sobre o Brasil em custos de produção e produtividade das fábricas.

Fora isso, dizem os executivos, a maior abertura comercial do país também dá flexibilidade para as empresas comprarem matérias-primas de onde há maior vantagem competitiva. "No México, uma montadora, na hora de desenvolver um carro, pode olhar para Estados Unidos, Europa e Ásia e avaliar de onde é mais barato comprar, por exemplo, o parachoque do veículo", diz o dirigente de uma grande fabricante de carros brasileira. Não a toa, o país atraiu nos últimos anos investimentos de montadoras como Nissan, Volkswagen, Honda e BMW.

The Wall Street Journal

Produção de carros do México supera a brasileira

Dudley Althaus e Rogério Jelmayer

Com o apoio do mercado norte-americano em recuperação, a produção da indústria automobilística do México, em plena expansão, vai consolidando uma ligeira vantagem sobre a do Brasil, seu rival regional que agora enfrenta dificuldades.

A produção mexicana de carros e caminhonetes, impulsionada pelas exportações, saltou 7,5% nos primeiros sete meses de 2014, para cerca de 1,86 milhão de veículos, em comparação com o mesmo período do ano anterior, segundo dados divulgados pela associação mexicana que representa o setor automobilístico.

"Isso reflete uma tendência que temos visto este ano", diz Fausto Cuevas, diretor-geral da Amia, a entidade mexicana das montadoras. Ele prevê que a produção alcançará 3,2 milhões de veículos este ano. "O panorama é favorável nos mercados internacionais."

Em contraste, a produção brasileira de carros e caminhonetes, direcionada sobretudo para o mercado interno, que atualmente sofre uma grave desaceleração econômica, recuou mais de 17% durante o mesmo período comparativo, para 1,7 milhão de unidades, segundo números também divulgados ontem pela Anfavea, a associação que representa o setor no Brasil.

A indústria automobilística de ambos os países, que são as duas maiores economias da América Latina e também os principais produtores de veículos da região, funciona de maneira oposta, o que ressalta as políticas econômicas diferentes que cada governo implementou nas últimas décadas, segundo analistas.

Protegida por dezenas de tratados de livre comércio - incluindo o Acordo Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta), com 20 anos de existência -, a indústria automobilística mexicana se tornou uma excelente plataforma de exportação. Em contraste, o Brasil vende para o exterior apenas uma pequena fração dos carros que fabrica e mantém o mercado interno bem protegido.

Nos últimos anos, o México vem exportando até 83% da sua produção, a maior parte para os Estados Unidos e Canadá. O Brasil vende uns 85% da sua produção para os consumidores brasileiros, e a maior parte das exportações vai para a vizinha Argentina, sua parceira comercial na região.

Agora, com a economia da Argentina em caos, as exportações de veículos do Brasil caíram mais de 30% em relação aos primeiros sete meses de 2014.

"A Argentina é o nosso maior cliente, eles representam 75% das nossas exportações", diz Luiz Moan Junior, presidente da Anfavea. "Não temos uma alternativa no curto prazo."

Além das tarifas de importação pagas por outros clientes estrangeiros, a mão de obra cara, os altos custos de eletricidade e outros itens reduziram a competitividade das montadoras brasileiras. Um Toyota Corolla, que custa apenas US$ 17.000 nos EUA, é vendido por cerca de US$ 30.000 no Brasil.

Ainda assim, durante grande parte dos últimos dez anos, a indústria automobilística do Brasil voou alto. O boom das commodities e programas de combate à pobreza do governo deram mais poder a uma classe média em ascensão. Descontos de impostos oferecidos pelo governo e financiamento fácil por bancos estatais também ajudaram.

As montadoras responderam construindo linhas de montagem no país para evitar as altas tarifas de importação. Fabricantes como General Motors, Ford e Toyota gastaram bilhões expandindo a capacidade de suas fábricas.

Apesar da atual desaceleração econômica, as montadoras brasileiras terão capacidade para produzir 6 milhões de veículos por ano até 2017, segundo a consultoria alemã Roland Berger Strategy Consultants.

Com montadoras internacionais e suas fornecedoras agora correndo para o México, o governo e analistas do setor privado preveem que a produção de carros e caminhonetes do país suba para uns 4 milhões de unidades por ano até o fim da década. Fábricas recém-inauguradas da Honda e da Mazda elevaram a produção deste ano. Uma fábrica da Audi que entrará em funcionamento no ano que vem vai produzir anualmente 150.000 utilitários esportivos de luxo. A BMW e um consórcio da Nissan e Daimler planejam produzir e exportar centenas de milhares de veículos de luxo até o fim da década.

"Isso prova que o México é um país confiável para investimentos nacionais e internacionais", disse o presidente mexicano Enrique Peña Nieto no início de julho, ao anunciar a nova fábrica, que será construída na cidade de San Luis Potosí, no norte do país.

A indústria automobilística, incluindo os fabricantes de autopeças, hoje representa 20% da produção industrial do México e 26% de suas exportações, disse Peña Nieto. É o dobro das exportações de petróleo do país, hoje em queda, e que há 35 anos respondiam por dois terços das vendas no exterior, disse ele. Os economistas estimam que a economia do México vai crescer 2,6% este ano, quase o dobro do desempenho de 2013. Em contraste, a expectativa dos economistas é que o Brasil cresça um modesto 0,9% este ano, prejudicado por uma inflação elevada que, segundo previsões, deve passar de 6% este ano. Com a desaceleração da economia, as montadoras brasileiras têm pouca margem de manobra, com os clientes evitando as revendedoras. As vendas de veículos caíram quase 14% em julho em relação a um ano antes.

Mas as concessionárias mexicanas também enfrentam grandes obstáculos. Os baixos salários, financiamento escasso e inacessível e a importação de centenas de milhares de carros usados dos EUA estão prejudicando a demanda doméstica por carros novos. Os 96.000 veículos vendidos em julho no México marcaram um salto de 11% sobre os números de julho de 2013. Mas as vendas desde janeiro subiram pouco mais de 1% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo dados do setor.


"Está muito abaixo das expectativas", diz Cuevas, da Amia. "Não é motivo para comemorar."

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Triciclos elétricos poderão ser usados como táxis no município do Rio

Lei formaliza serviço na Ilha de Paquetá, mas ele pode se estender ao restante da cidade

POR LUIZ ERNESTO MAGALHÃES

18/06/2014 - O Globo

 Ednard com passageiros em Paquetá:
Ednard com passageiros em Paquetá: "A lei vem em boa hora"
Foto: Divulgação

RIO — O prefeito Eduardo Paes sancionou, nesta terça-feira, uma lei que libera o uso de triciclos elétricos para prestar serviços de táxi. Autora da proposta, a vereadora Laura Carneiro (PTB) explicou que o objetivo é levar para a formalidade o serviço prestado hoje na Ilha de Paquetá a turistas e moradores. Como a legislação é genérica, porém, abre margem para que a atividade seja exercida em outros pontos da cidade. A Secretaria municipal de Transportes, que regulamentará o serviço, preferiu não se pronunciar nesta terça-feira sobre a nova lei.

— Como é proibida a circulação de carros em Paquetá, os triciclos são usados para deslocamentos na ilha. Mas, por falta de amparo legal, havia dúvidas sobre como o serviço deveria operar. A regulamentação pode criar um novo serviço turístico que atenda a toda a cidade. Em algumas cidades da Alemanha, por exemplo, esse tipo de atividade é um sucesso — disse Laura Carneiro.

O secretário municipal de Meio Ambiente, Carlos Alberto Muniz, disse que ainda vai estudar a nova lei. Caso o serviço se mostre viável, ela acha que a prefeitura poderá estudar a concessão de licenças para a atividade na orla, no Aterro do Flamengo e na Quinta da Boa Vista.

Em Paquetá, onde 36 operadores cobram R$ 5 (uma pessoa), R$ 8 (duas pessoas) e R$ 36 (passeio turístico) nos deslocamentos pela ilha, a sanção da lei foi comemorada:

— Há pouco tempo, tivemos problemas com a polícia. A legalização vem em boa hora — diz Ednard Lima Pereira, representante dos operadores do serviço.


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quinta-feira, 12 de junho de 2014

Aplicativos de carona remunerada chegam ao Rio e provocam polêmica

Taxistas protestam, prefeitura considera serviço irregular e polícia investiga a contravenção de uso ilegal da profissão

POR SELMA SCHMIDT

12/06/2014 - O Globo

 Taxistas fazem carreata contra aplicativos que começaram a ser usados no Rio há dois meses e permitem o transportes de passageiros em carros particulares Foto: Genilson Araújo
Taxistas fazem carreata contra aplicativos que começaram a ser usados no Rio há dois meses e permitem o transportes de passageiros em carros particulares

Foto: Genilson Araújo

RIO — Pagamento? Não! Doação. Com essa premissa, o empresário carioca Yonathan Yuri Faber, de 28 anos e formado em Direito, criou o Zaznu, um aplicativo brasileiro de carona remunerada. A novidade, que o jovem importou de São Francisco, nos Estados Unidos, onde morou por dois anos, desembarcou nos smartphones do Rio em 12 de março, provocou reação de taxistas e já virou objeto de investigação da Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática (DRCI), acionada pela Secretaria municipal de Transportes, que considera o serviço irregular.

Nesta quarta-feira, um grupo de cerca de 50 motoristas de táxis promoveu uma carreata contra aplicativos que permitem o uso de carros particulares no transporte de passageiros — o Uber, concorrente da Zaznu, foi lançado oficialmente nesta quarta-feira em solo carioca. Do Aterro a Copacabana, a carreata de "amarelinhos" provocou engarrafamento e obrigou a seleção da Inglaterra a trafegar na contramão pela Avenida Atlântica.

Taxistas exibem faixa durante carreata na Zona Sul do Rio - Foto da leitora Elba Boechat / Eu-Repórter
A despeito de tanto ti-ti-ti, o Zaznu está bombando. Nas contas de Yuri, hoje no Rio estão cadastrados e atuando ativamente quase 600 motoristas de automóveis particulares. Incluindo São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Curitiba e Porto Alegre, já são mil. E os passageiros chegam a 60 mil no país, dos quais 35 mil no Rio. Caso do advogado Heitor Roberto Maia, de 24 anos, usuário de carteirinha do serviço há dois meses.

— Uso o serviço, em média, dez vezes por semana, entre idas e vindas. Consigo economizar um terço do dinheiro que, antes, gastava com táxis. Trata-se de uma solução de transporte interessante, e não há cobrança pela bandeira 2. Além disso, há o contato pessoal com os motoristas, o que humaniza o trajeto — argumenta Heitor, que mora no Flamengo, trabalha no Leblon e faz MBA em Botafogo.

Pedro Paulo Milanez, de 31 anos, mora em Nilópolis, estuda economia no campus de Nova Iguaçu da Universidade Federal Rural e trabalha no Centro. Nos deslocamentos e em horas vagas, trabalha como "caronista", ou seja motorista do Zaznu. E, com o bico, o seu salário fixo, de cerca de R$ 3.500, está ficando entre R$ 800 e R$ 1.000 mais gordo. Por enquanto.

— Com o aumento da demanda, acho que posso ganhar entre R$ 2 mil e R$ 3 mil por mês em doações. É importante também as amizades que se faz. Estou podendo ainda conhecer melhor o Rio de Janeiro. Havia ruas que eu nunca tinha ido — conta Pedro. — Não estamos disputando com os táxis. Fazemos um trabalho complementar.

NO UBER, SÓ MOTORISTAS PROFISSIONAIS

Diferentemente do Zaznu, no Uber o passageiro não faz doações. Simplesmente, paga pelo serviço. Segundo Solamon Cruz Estin, lançador do Uber no Brasil, a empresa só cadastra motoristas profissionais — embora não sejam taxistas — e usa carros executivos.

— Oferecemos um serviço melhor, mais sofisticado e mais confortável que o dos táxis — garante Solamon. — O preço é um pouco superior ao dos táxis; em média, 30%.

A plataforma Uber tem CNPJ e está registrada como empresa de tecnologia e logística digital. Os seus donos, porém, não consideraram necessário se regularizar junto à prefeitura.

— Não somos uma empresa de transporte — justifica Solamon.


O lançador do Uber no Brasil não revela números sobre motoristas e passageiros cadastrados, embora a plataforma esteja em testes no Rio desde 15 de maio. Quanto aos protestos, ele atribui à resistência diante de novidades.

Já a equipe de Yuri começou a delinear o projeto do Zaznu em agosto do ano passado, tendo como modelo o Lyft — concorrente do Uber, em São Francisco. Para definir o nome da plataforma brasileira, o empresário se inspirou em Israel, onde viveu por seis anos. Zaznu, uma gíria, significa "partiu?". Já a logo do aplicativo — um Pug enrugado, segurando um volante — homenageia Melão, um cachorro que o jovem deixou com a ex-namorada em São Francisco.

— Estamos indo melhor do que esperávamos. O serviço de táxis no Rio é fraco. Faltam táxis nas ruas. É também importante a conscientização do carioca em compartilhar seus bens — ressalta Yuri.

Diante da concorrência, Allan de Oliveira, do movimento Taxinforme, passou a liderar no Facebook e nas ruas uma campanha contra os aplicativos de carona. Ele bate na tecla de que se tratam de plataformas ilegais.

— Diferentemente de outros países, o Brasil tem uma legislação forte em relação ao serviço remunerado de transportes. O Zaznu é a farsa da carona solidária. Fazemos cinco vistorias por ano e temos que manter nossa documentação em dia. Estamos vendo nossa profissão ser invadida por um transporte remunerado ilegal — alega Allan, de 44 anos, que trabalha há 14 como taxista.

Por e-mail, o presidente do Sindicato dos Taxistas do Rio, Luiz Antônio Barbosa da Silva, também reage: "carona remunerada é transporte proibido, e, portanto deve ser reprimida pelos órgãos públicos". Segundo ele, "para fazer o transporte de pessoas, o profissional tem que se submeter a regras elaboradas pela Secretaria municipal de Transportes, e cumprir exigências para ter seus direitos". Luiz Antônio garante que, a pedido do sindicato, "haverá repressão pelos órgãos competentes e fiscalizadores".

É Yuri quem dá a resposta aos descontentes:

— Sinto muito pelos taxistas. Mas estamos ajudando muita gente. A prefeitura defende a carona, e trabalhamos para mudar a forma de transporte na cidade.

PAGAMENTO SÓ COM CARTÃO DE CRÉDITO

Por sua vez, a Secretaria municipal de Transportes, está convencida que o Zaznu usa "veículos particulares, realizando serviço irregular de transporte de passageiros sob cobrança". Por e-mail, o órgão afirma que "apenas táxis regulamentados pela prefeitura, e com a devida autorização, podem realizar transporte de passageiros sob cobrança". Diante do lançamento, nesta quarta-feira, do Uber, a secretaria informou que tomará a mesma providência adotada em relação ao Zaznu: enviará ofício à DRCI, solicitando investigação.

Também por e-mail, o delegado Alessandro Thiers, titular da DRCI, confirma que "existe uma investigação em curso sobre aplicativos em que pessoas utilizam carros particulares para realizar serviço irregular de transporte de passageiros sob cobrança". Está sendo investigada "a contravenção de exercício ilegal de profissão ou atividade".

No Zaznu, não existem taxímetros. No fim do trajeto, há um cálculo sugerido — entre 20% e 35% inferior ao preço de uma corrida de táxi —, e o passageiro decide se confirma ou não a doação. Só que os motoristas podem avaliar os usuários; e vice-versa. Com isso, quem não paga tende a ser rejeitado por donos de veículos.

Além de smartphone (com sistemas operacionais iOS e Android), motoristas e passageiros do Zaznu precisam ter conta no Facebook. A empresa fica com 20% das doações. O mesmo percentual corresponde à fatia das transações que fica com o Uber.

O próprio Yuri dá e pega caronas. Uma experiência, que, para ele, acabou indo além, ao dar uma carona, na Lagoa, a uma moça que precisava de alguém para levar a sua bicicleta. Apaixonado por bikes, ele e a "caroneira" engrenaram um papo, que resultou numa proposta de emprego:

— Ela me contou que a namorada era designer. Eu estava precisando de um profissional desses para fazer um trabalho, e a contratei.

E de "caronista" a "caroneiro" ....

— Toda a vez que vou para o aeroporto pego carona com uma estudante da UFRJ. Com isso, ela ganha R$ 50.

O interessado em ser motorista do Zaznu tem que preencher cadastro no site (zaznu.co) ou via aplicativo. Em prol da segurança, deve anexar documentos (carteira de habilitação, seguro do carro, comprovante de residência e documento do veículo). Quem pleiteia ser "caronista" tem ainda que possuir uma conta no Facebook, que permite traçar o seu perfil. Depois, a pessoa é chamada para uma entrevista no escritório da empresa. Para os "caroneiros", o cadastro e a conta no Facebook também são fundamentais. Outra exigência é que forneçam o número de um cartão de crédito, pois as doações são feitas através dele. Aliás, o cartão de crédito é também a única forma de o passageiro do Uber pagar pela corrida.

Yuri tem um sócio israelense, que é programador e mora nos Estados Unidos. Como tem uma empresa prestadora de serviço, ele garante que paga tributos pelas transações à prefeitura. A firma está funcionando num sobrado em Botafogo e, logo, logo, seus dez funcionários vão virar 20. Quanto ao valor do investimento, o empresário faz segredo.

PALAVRA DE ESPECIALISTA

A batalha dos donos de aplicativos para levar adiante seu negócio não será fácil. Veja o que diz o advogado Jonas Lopes, presidente da Comissão do Direito de Transporte da OAB-RJ:

"A questão ainda não chegou ao Judiciário, nos restando interpretar a legislação vigente.

O código civil prevê a questão em seu artigo 736, que diz que 'não se subordina às normas do contrato de transporte o feito gratuitamente, por amizade ou cortesia" e que "não se considera gratuito o transporte quando, embora feito sem remuneração, o transportador auferir vantagens indiretas'.

Em grupos fechados, como de estudantes de universidades que criam páginas no Facebook, para se deslocarem juntos a municípios vizinhos, entendemos que permanece a figura da cortesia, pois geralmente a carona é dada a conhecidos ou pessoas com alguma referência de amigos, ao contrário da prestação de serviços que visa lucro sem diferenciar sua clientela.

Em aplicativos onde qualquer pessoa se cadastra para oferecer carona e qualquer um pode usufruir dela fica um pouco mais distante a caracterização de simples cortesia, ficando mais evidente uma prestação de serviço.

Por mais que muitos aplicativos defendam que a remuneração é opcional, devendo ser considerada doação, na prática, acreditamos que quem se cadastra para oferecer carona, certamente não irá aceitar fazê-lo a um desconhecido sem que seja feita a "doação" correspondente, que, em alguns aplicativos, é inclusive pré-fixada.

O Código de Transito Brasileiro veda essa prática. Em seu artigo 231, afirma que transitar com o veículo efetuando transporte remunerado de pessoas ou bens, quando não for licenciado para esse fim, salvo casos de força maior ou com permissão da autoridade competente, é infração média, prevendo multa e retenção do veículo.

A delimitação da legalidade e do tipo de transporte que caracterizaria ou não "cortesia" se faz essencial para a delimitação da responsabilidade sobre eventuais danos causados ao transportado. No transporte gratuito, a súmula 145 do Superior Tribunal de Justiça prevê que o transportador somente irá responder por danos causados ao transportado, caso incorra em dolo ou culpa grave. Situação que diverge do transporte remunerado, quando o transportador responde de forma ampla pelos danos que venham a ser causador ao transportado."

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Aplicativos de carona remunerada chegam ao Rio e provocam polêmica

Taxistas protestam, prefeitura considera serviço irregular e polícia investiga a contravenção de uso ilegal da profissão

POR SELMA SCHMIDT

12/06/2014 - O Globo

 Taxistas fazem carreata contra aplicativos que começaram a ser usados no Rio há dois meses e permitem o transportes de passageiros em carros particulares Foto: Genilson Araújo
Taxistas fazem carreata contra aplicativos que começaram a ser usados no Rio há dois meses e permitem o transportes de passageiros em carros particulares

Foto: Genilson Araújo

RIO — Pagamento? Não! Doação. Com essa premissa, o empresário carioca Yonathan Yuri Faber, de 28 anos e formado em Direito, criou o Zaznu, um aplicativo brasileiro de carona remunerada. A novidade, que o jovem importou de São Francisco, nos Estados Unidos, onde morou por dois anos, desembarcou nos smartphones do Rio em 12 de março, provocou reação de taxistas e já virou objeto de investigação da Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática (DRCI), acionada pela Secretaria municipal de Transportes, que considera o serviço irregular.

Nesta quarta-feira, um grupo de cerca de 50 motoristas de táxis promoveu uma carreata contra aplicativos que permitem o uso de carros particulares no transporte de passageiros — o Uber, concorrente da Zaznu, foi lançado oficialmente nesta quarta-feira em solo carioca. Do Aterro a Copacabana, a carreata de "amarelinhos" provocou engarrafamento e obrigou a seleção da Inglaterra a trafegar na contramão pela Avenida Atlântica.

Taxistas exibem faixa durante carreata na Zona Sul do Rio - Foto da leitora Elba Boechat / Eu-Repórter
A despeito de tanto ti-ti-ti, o Zaznu está bombando. Nas contas de Yuri, hoje no Rio estão cadastrados e atuando ativamente quase 600 motoristas de automóveis particulares. Incluindo São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Curitiba e Porto Alegre, já são mil. E os passageiros chegam a 60 mil no país, dos quais 35 mil no Rio. Caso do advogado Heitor Roberto Maia, de 24 anos, usuário de carteirinha do serviço há dois meses.

— Uso o serviço, em média, dez vezes por semana, entre idas e vindas. Consigo economizar um terço do dinheiro que, antes, gastava com táxis. Trata-se de uma solução de transporte interessante, e não há cobrança pela bandeira 2. Além disso, há o contato pessoal com os motoristas, o que humaniza o trajeto — argumenta Heitor, que mora no Flamengo, trabalha no Leblon e faz MBA em Botafogo.

Pedro Paulo Milanez, de 31 anos, mora em Nilópolis, estuda economia no campus de Nova Iguaçu da Universidade Federal Rural e trabalha no Centro. Nos deslocamentos e em horas vagas, trabalha como "caronista", ou seja motorista do Zaznu. E, com o bico, o seu salário fixo, de cerca de R$ 3.500, está ficando entre R$ 800 e R$ 1.000 mais gordo. Por enquanto.

— Com o aumento da demanda, acho que posso ganhar entre R$ 2 mil e R$ 3 mil por mês em doações. É importante também as amizades que se faz. Estou podendo ainda conhecer melhor o Rio de Janeiro. Havia ruas que eu nunca tinha ido — conta Pedro. — Não estamos disputando com os táxis. Fazemos um trabalho complementar.

NO UBER, SÓ MOTORISTAS PROFISSIONAIS

Diferentemente do Zaznu, no Uber o passageiro não faz doações. Simplesmente, paga pelo serviço. Segundo Solamon Cruz Estin, lançador do Uber no Brasil, a empresa só cadastra motoristas profissionais — embora não sejam taxistas — e usa carros executivos.

— Oferecemos um serviço melhor, mais sofisticado e mais confortável que o dos táxis — garante Solamon. — O preço é um pouco superior ao dos táxis; em média, 30%.

A plataforma Uber tem CNPJ e está registrada como empresa de tecnologia e logística digital. Os seus donos, porém, não consideraram necessário se regularizar junto à prefeitura.

— Não somos uma empresa de transporte — justifica Solamon.


O lançador do Uber no Brasil não revela números sobre motoristas e passageiros cadastrados, embora a plataforma esteja em testes no Rio desde 15 de maio. Quanto aos protestos, ele atribui à resistência diante de novidades.

Já a equipe de Yuri começou a delinear o projeto do Zaznu em agosto do ano passado, tendo como modelo o Lyft — concorrente do Uber, em São Francisco. Para definir o nome da plataforma brasileira, o empresário se inspirou em Israel, onde viveu por seis anos. Zaznu, uma gíria, significa "partiu?". Já a logo do aplicativo — um Pug enrugado, segurando um volante — homenageia Melão, um cachorro que o jovem deixou com a ex-namorada em São Francisco.

— Estamos indo melhor do que esperávamos. O serviço de táxis no Rio é fraco. Faltam táxis nas ruas. É também importante a conscientização do carioca em compartilhar seus bens — ressalta Yuri.

Diante da concorrência, Allan de Oliveira, do movimento Taxinforme, passou a liderar no Facebook e nas ruas uma campanha contra os aplicativos de carona. Ele bate na tecla de que se tratam de plataformas ilegais.

— Diferentemente de outros países, o Brasil tem uma legislação forte em relação ao serviço remunerado de transportes. O Zaznu é a farsa da carona solidária. Fazemos cinco vistorias por ano e temos que manter nossa documentação em dia. Estamos vendo nossa profissão ser invadida por um transporte remunerado ilegal — alega Allan, de 44 anos, que trabalha há 14 como taxista.

Por e-mail, o presidente do Sindicato dos Taxistas do Rio, Luiz Antônio Barbosa da Silva, também reage: "carona remunerada é transporte proibido, e, portanto deve ser reprimida pelos órgãos públicos". Segundo ele, "para fazer o transporte de pessoas, o profissional tem que se submeter a regras elaboradas pela Secretaria municipal de Transportes, e cumprir exigências para ter seus direitos". Luiz Antônio garante que, a pedido do sindicato, "haverá repressão pelos órgãos competentes e fiscalizadores".

É Yuri quem dá a resposta aos descontentes:

— Sinto muito pelos taxistas. Mas estamos ajudando muita gente. A prefeitura defende a carona, e trabalhamos para mudar a forma de transporte na cidade.

PAGAMENTO SÓ COM CARTÃO DE CRÉDITO

Por sua vez, a Secretaria municipal de Transportes, está convencida que o Zaznu usa "veículos particulares, realizando serviço irregular de transporte de passageiros sob cobrança". Por e-mail, o órgão afirma que "apenas táxis regulamentados pela prefeitura, e com a devida autorização, podem realizar transporte de passageiros sob cobrança". Diante do lançamento, nesta quarta-feira, do Uber, a secretaria informou que tomará a mesma providência adotada em relação ao Zaznu: enviará ofício à DRCI, solicitando investigação.

Também por e-mail, o delegado Alessandro Thiers, titular da DRCI, confirma que "existe uma investigação em curso sobre aplicativos em que pessoas utilizam carros particulares para realizar serviço irregular de transporte de passageiros sob cobrança". Está sendo investigada "a contravenção de exercício ilegal de profissão ou atividade".

No Zaznu, não existem taxímetros. No fim do trajeto, há um cálculo sugerido — entre 20% e 35% inferior ao preço de uma corrida de táxi —, e o passageiro decide se confirma ou não a doação. Só que os motoristas podem avaliar os usuários; e vice-versa. Com isso, quem não paga tende a ser rejeitado por donos de veículos.

Além de smartphone (com sistemas operacionais iOS e Android), motoristas e passageiros do Zaznu precisam ter conta no Facebook. A empresa fica com 20% das doações. O mesmo percentual corresponde à fatia das transações que fica com o Uber.

O próprio Yuri dá e pega caronas. Uma experiência, que, para ele, acabou indo além, ao dar uma carona, na Lagoa, a uma moça que precisava de alguém para levar a sua bicicleta. Apaixonado por bikes, ele e a "caroneira" engrenaram um papo, que resultou numa proposta de emprego:

— Ela me contou que a namorada era designer. Eu estava precisando de um profissional desses para fazer um trabalho, e a contratei.

E de "caronista" a "caroneiro" ....

— Toda a vez que vou para o aeroporto pego carona com uma estudante da UFRJ. Com isso, ela ganha R$ 50.

O interessado em ser motorista do Zaznu tem que preencher cadastro no site (zaznu.co) ou via aplicativo. Em prol da segurança, deve anexar documentos (carteira de habilitação, seguro do carro, comprovante de residência e documento do veículo). Quem pleiteia ser "caronista" tem ainda que possuir uma conta no Facebook, que permite traçar o seu perfil. Depois, a pessoa é chamada para uma entrevista no escritório da empresa. Para os "caroneiros", o cadastro e a conta no Facebook também são fundamentais. Outra exigência é que forneçam o número de um cartão de crédito, pois as doações são feitas através dele. Aliás, o cartão de crédito é também a única forma de o passageiro do Uber pagar pela corrida.

Yuri tem um sócio israelense, que é programador e mora nos Estados Unidos. Como tem uma empresa prestadora de serviço, ele garante que paga tributos pelas transações à prefeitura. A firma está funcionando num sobrado em Botafogo e, logo, logo, seus dez funcionários vão virar 20. Quanto ao valor do investimento, o empresário faz segredo.

PALAVRA DE ESPECIALISTA

A batalha dos donos de aplicativos para levar adiante seu negócio não será fácil. Veja o que diz o advogado Jonas Lopes, presidente da Comissão do Direito de Transporte da OAB-RJ:

"A questão ainda não chegou ao Judiciário, nos restando interpretar a legislação vigente.

O código civil prevê a questão em seu artigo 736, que diz que 'não se subordina às normas do contrato de transporte o feito gratuitamente, por amizade ou cortesia" e que "não se considera gratuito o transporte quando, embora feito sem remuneração, o transportador auferir vantagens indiretas'.

Em grupos fechados, como de estudantes de universidades que criam páginas no Facebook, para se deslocarem juntos a municípios vizinhos, entendemos que permanece a figura da cortesia, pois geralmente a carona é dada a conhecidos ou pessoas com alguma referência de amigos, ao contrário da prestação de serviços que visa lucro sem diferenciar sua clientela.

Em aplicativos onde qualquer pessoa se cadastra para oferecer carona e qualquer um pode usufruir dela fica um pouco mais distante a caracterização de simples cortesia, ficando mais evidente uma prestação de serviço.

Por mais que muitos aplicativos defendam que a remuneração é opcional, devendo ser considerada doação, na prática, acreditamos que quem se cadastra para oferecer carona, certamente não irá aceitar fazê-lo a um desconhecido sem que seja feita a "doação" correspondente, que, em alguns aplicativos, é inclusive pré-fixada.

O Código de Transito Brasileiro veda essa prática. Em seu artigo 231, afirma que transitar com o veículo efetuando transporte remunerado de pessoas ou bens, quando não for licenciado para esse fim, salvo casos de força maior ou com permissão da autoridade competente, é infração média, prevendo multa e retenção do veículo.

A delimitação da legalidade e do tipo de transporte que caracterizaria ou não "cortesia" se faz essencial para a delimitação da responsabilidade sobre eventuais danos causados ao transportado. No transporte gratuito, a súmula 145 do Superior Tribunal de Justiça prevê que o transportador somente irá responder por danos causados ao transportado, caso incorra em dolo ou culpa grave. Situação que diverge do transporte remunerado, quando o transportador responde de forma ampla pelos danos que venham a ser causador ao transportado."

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