quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Brasil perde posição em ranking de carros

07/08/2014 - Valor Econômico / The Wall Street Journal

 A crise atravessada pela indústria automobilística se expressa não apenas em paradas de fábricas ou cortes de vagas de trabalho, mas também na perda do status ostentado pelo Brasil em rankings globais do setor. Além de perder para a Alemanha a quarta colocação entre os maiores mercados automotivos do mundo, o país foi ultrapassado pelo México entre os grandes produtores de veículos.

De janeiro a julho, o México produziu 38,5 mil veículos a mais do que o Brasil, que, dessa forma, cai para o oitavo lugar na lista dos principais centros de produção de automóveis do mundo. Já na lista dos grandes mercados automotivos, a Alemanha agora está pouco mais de 33 mil veículos à frente do consumo brasileiro. Em junho, os alemães já tinham recuperado a quarta colocação perdida há quatro anos (veja gráfico).

Se a queda nas vendas é atribuída a questões como retirada de estímulos, restrições de crédito e maior endividamento das famílias, a perda de posição no ranking da produção, além do cenário doméstico, se deve à falta de competitividade das montadoras brasileiras para acessar novos mercados internacionais.

Enquanto o Brasil depende quase que exclusivamente da demanda da Argentina - hoje em crise - para melhorar suas exportações, o México tem sua produção atrelada à recuperação do mercado nos Estados Unidos, com quem tem um acordo de livre comércio. Como resultado, o Brasil, mesmo tendo um mercado interno maior, está atrás na produção não apenas do México, mas também de Coreia e Índia.

Neste ano, com a derrocada no consumo argentino - destino de praticamente quatro em cada cinco carros embarcados por montadoras daqui -, as exportações de veículos produzidos no Brasil recuam mais de 35%. Quando se soma isso à queda de 8,6% no consumo interno o resultado é queda superior a 17% da produção, como mostram os resultados divulgados ontem pela Anfavea, entidade das montadoras instaladas no país.

Já no México, o mercado doméstico está praticamente estagnado - o que também afeta o Brasil, uma vez que o país é o segundo destino dos carros brasileiros. A recuperação americana permitiu, porém, que as montadoras mexicanas aumentassem a produção em 7,5%. Pouco mais de 83% dos veículos produzidos no México vão para o exterior.

Só os Estados Unidos absorveram 71,5% das exportações de veículos mexicanos e, neste ano, estão ampliando em quase 20% as importações dos automóveis de seu parceiro no Nafta. Já o Canadá, o outro aliado no bloco de livre comércio da América do Norte, absorve pouco mais de 9% das exportações de carros do México, de onde está comprando 22% a mais.

Empresários de montadoras brasileiras dizem que, não bastasse o acesso a grandes mercados, o México leva vantagem sobre o Brasil em custos de produção e produtividade das fábricas.

Fora isso, dizem os executivos, a maior abertura comercial do país também dá flexibilidade para as empresas comprarem matérias-primas de onde há maior vantagem competitiva. "No México, uma montadora, na hora de desenvolver um carro, pode olhar para Estados Unidos, Europa e Ásia e avaliar de onde é mais barato comprar, por exemplo, o parachoque do veículo", diz o dirigente de uma grande fabricante de carros brasileira. Não a toa, o país atraiu nos últimos anos investimentos de montadoras como Nissan, Volkswagen, Honda e BMW.

The Wall Street Journal

Produção de carros do México supera a brasileira

Dudley Althaus e Rogério Jelmayer

Com o apoio do mercado norte-americano em recuperação, a produção da indústria automobilística do México, em plena expansão, vai consolidando uma ligeira vantagem sobre a do Brasil, seu rival regional que agora enfrenta dificuldades.

A produção mexicana de carros e caminhonetes, impulsionada pelas exportações, saltou 7,5% nos primeiros sete meses de 2014, para cerca de 1,86 milhão de veículos, em comparação com o mesmo período do ano anterior, segundo dados divulgados pela associação mexicana que representa o setor automobilístico.

"Isso reflete uma tendência que temos visto este ano", diz Fausto Cuevas, diretor-geral da Amia, a entidade mexicana das montadoras. Ele prevê que a produção alcançará 3,2 milhões de veículos este ano. "O panorama é favorável nos mercados internacionais."

Em contraste, a produção brasileira de carros e caminhonetes, direcionada sobretudo para o mercado interno, que atualmente sofre uma grave desaceleração econômica, recuou mais de 17% durante o mesmo período comparativo, para 1,7 milhão de unidades, segundo números também divulgados ontem pela Anfavea, a associação que representa o setor no Brasil.

A indústria automobilística de ambos os países, que são as duas maiores economias da América Latina e também os principais produtores de veículos da região, funciona de maneira oposta, o que ressalta as políticas econômicas diferentes que cada governo implementou nas últimas décadas, segundo analistas.

Protegida por dezenas de tratados de livre comércio - incluindo o Acordo Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta), com 20 anos de existência -, a indústria automobilística mexicana se tornou uma excelente plataforma de exportação. Em contraste, o Brasil vende para o exterior apenas uma pequena fração dos carros que fabrica e mantém o mercado interno bem protegido.

Nos últimos anos, o México vem exportando até 83% da sua produção, a maior parte para os Estados Unidos e Canadá. O Brasil vende uns 85% da sua produção para os consumidores brasileiros, e a maior parte das exportações vai para a vizinha Argentina, sua parceira comercial na região.

Agora, com a economia da Argentina em caos, as exportações de veículos do Brasil caíram mais de 30% em relação aos primeiros sete meses de 2014.

"A Argentina é o nosso maior cliente, eles representam 75% das nossas exportações", diz Luiz Moan Junior, presidente da Anfavea. "Não temos uma alternativa no curto prazo."

Além das tarifas de importação pagas por outros clientes estrangeiros, a mão de obra cara, os altos custos de eletricidade e outros itens reduziram a competitividade das montadoras brasileiras. Um Toyota Corolla, que custa apenas US$ 17.000 nos EUA, é vendido por cerca de US$ 30.000 no Brasil.

Ainda assim, durante grande parte dos últimos dez anos, a indústria automobilística do Brasil voou alto. O boom das commodities e programas de combate à pobreza do governo deram mais poder a uma classe média em ascensão. Descontos de impostos oferecidos pelo governo e financiamento fácil por bancos estatais também ajudaram.

As montadoras responderam construindo linhas de montagem no país para evitar as altas tarifas de importação. Fabricantes como General Motors, Ford e Toyota gastaram bilhões expandindo a capacidade de suas fábricas.

Apesar da atual desaceleração econômica, as montadoras brasileiras terão capacidade para produzir 6 milhões de veículos por ano até 2017, segundo a consultoria alemã Roland Berger Strategy Consultants.

Com montadoras internacionais e suas fornecedoras agora correndo para o México, o governo e analistas do setor privado preveem que a produção de carros e caminhonetes do país suba para uns 4 milhões de unidades por ano até o fim da década. Fábricas recém-inauguradas da Honda e da Mazda elevaram a produção deste ano. Uma fábrica da Audi que entrará em funcionamento no ano que vem vai produzir anualmente 150.000 utilitários esportivos de luxo. A BMW e um consórcio da Nissan e Daimler planejam produzir e exportar centenas de milhares de veículos de luxo até o fim da década.

"Isso prova que o México é um país confiável para investimentos nacionais e internacionais", disse o presidente mexicano Enrique Peña Nieto no início de julho, ao anunciar a nova fábrica, que será construída na cidade de San Luis Potosí, no norte do país.

A indústria automobilística, incluindo os fabricantes de autopeças, hoje representa 20% da produção industrial do México e 26% de suas exportações, disse Peña Nieto. É o dobro das exportações de petróleo do país, hoje em queda, e que há 35 anos respondiam por dois terços das vendas no exterior, disse ele. Os economistas estimam que a economia do México vai crescer 2,6% este ano, quase o dobro do desempenho de 2013. Em contraste, a expectativa dos economistas é que o Brasil cresça um modesto 0,9% este ano, prejudicado por uma inflação elevada que, segundo previsões, deve passar de 6% este ano. Com a desaceleração da economia, as montadoras brasileiras têm pouca margem de manobra, com os clientes evitando as revendedoras. As vendas de veículos caíram quase 14% em julho em relação a um ano antes.

Mas as concessionárias mexicanas também enfrentam grandes obstáculos. Os baixos salários, financiamento escasso e inacessível e a importação de centenas de milhares de carros usados dos EUA estão prejudicando a demanda doméstica por carros novos. Os 96.000 veículos vendidos em julho no México marcaram um salto de 11% sobre os números de julho de 2013. Mas as vendas desde janeiro subiram pouco mais de 1% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo dados do setor.


"Está muito abaixo das expectativas", diz Cuevas, da Amia. "Não é motivo para comemorar."

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