segunda-feira, 27 de outubro de 2014

‘Carro que voa’ busca marco regulatório

27/10/2014 - O Estado de SP / The Washington Post

HAYLEY TSUKAYAMA - THE WASHINGTON POST

Sejamos sinceros: já é 2014, e a indústria automobilística desapontou completamente uma geração de amantes da ficção científica. Onde estão os carros voadores? Quem tenta preencher esse vazio é a Terrafugia, que se descreve como "a empresa dos carros voadores". Ela anunciou o futuro lançamento do modelo "Transition", com asas dobráveis que permitem ao veículo fazer a conversão de carro para avião em cerca de 20 segundos ao pressionar de um botão. Isso é que é conversível.

É preciso reconhecer que o Terrafugia Transition não será exatamente o carro voador à moda dos Jetsons, como muitos sonham. Mais correto seria descrever o Terrafugia Transition como um avião que pode ser dirigido, e não um carro que pode voar. Infelizmente, isso significa que não será possível escapar voando de um congestionamento. Embora seja improvável que a combinação carro/avião substitua a minivan, a empresa tenta definir um padrão para que o novo veículo possa ser classificado pelas autoridades regulatórias americanas.

"Trata-se de um primeiro passo prático", disse o diretor executivo da Terrafugia, Carl Dietrich. "É o que podemos fazer com a infraestrutura existente." Do ponto de vista regulatório, a Terrafugia incorporou medidas de segurança exigidas tanto pela Administração Federal da Aviação quanto pela Administração Nacional de Segurança no Tráfego das Estradas.

Assim, o Transition tem tanto paraquedas quanto airbag. Para compensar a ausência de um para-brisa traseiro, o Transition tem uma câmera, permitindo que os motoristas vejam o que há atrás deles por meio de uma tela no painel. Afinal, ninguém quer se envolver numa fechada acidental com um avião. O veículo tem tudo que se esperaria de um carro, como cintos de segurança e espelhos retrovisores laterais que conseguem ver além das imensas asas em modo carro e podem ser removidos durante o voo.

Complicações.Apesar de ter autorização para rodar nas pistas (com as asas erguidas) o Transition não é exatamente aquilo que chamaríamos de veículo para todos os usos. Para usar tanto a função de carro quanto a de avião, é preciso ter um brevê de piloto esportivo - mas, para quem pensa em gastar cerca de US$ 279 mil num veículo, isso não deve ser um empecilho.

Também será necessária uma pista de decolagem: o Transition precisa de bastante espaço para decolar, algo que se torna possível a partir da velocidade de 115 km/h. E essa pista de decolagem não pode ser escolhida a esmo, porque ninguém chega no Aeroporto Nacional Reagan ou no Aeroporto O'Hare, em Chicago, na esperança de encontrar "vaga". Os donos do novo carro deverão um dos 5 mil aeroportos regionais espalhados pelos Estados Unidos.

Os donos do novo veículo não precisarão, porém, ter seu próprio hangar. Com as asas dobradas, o Transition não é muito maior do que um Cadillac Escalade ou um Ford F-350, dizem executivos da Terrafugia. Com isso, o veículo deve caber numa garagem comum. Além disso, o combustível usado é a gasolina premium, com rendimento de quase 15 km por litro no solo. Em voo, esse rendimento é um pouco menor - cerca de 8,5 km por litro ao viajar a 160km/h.

O veículo tem um volante para a pilotagem no chão, que pode ser trocada por um manche para os voos. Há quatro pedais no chão: acelerador e freio, e dois para controlar o leme. Para o futuro, a Terrafugia está planejando um carro voador que vai dispensar a pista de decolagem - mas, para isso, será preciso esperar um pouco. O processo de desenvolvimento do modelo, batizado de TF-X, deve consumir de 8 a 12 anos.

O futuro dos Jetsons, que imaginou um carro voador na garagem de cada família, passava-se em 2062. Para quem quer atuar neste setor, o relógio está fazendo tique-taque. 

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Peugeot e Embraer desenvolvem carro com material sustentável

21/10/2014 - Valor Econômico

Um laboratório voltado para o desenvolvimento de materiais sustentáveis para interiores de aeronaves foi o pontapé inicial para a construção do 208 natural, carro conceito resultante de uma parceria entre a Embraer e a PSA Peugeot Citroën. O resultado será apresentado no Salão Internacional do Automóvel de São Paulo 2014, que acontece entre 30 de outubro e 4 de novembro.

O carro foi concebido pelo Centro de Estilo da PSA na América Latina, e contou com a participação de mais de 200 profissionais multidisciplinares de 20 empresas instaladas no Brasil. "Este carro é uma homenagem ao Brasil. Seu conceito é 100% brasileiro, pois utiliza fontes sustentáveis trabalhadas localmente", diz o gerente de Estilo de Cores e Materiais da PSA para América Latina, responsável por todas as fase de desenvolvimento e produção, Fabien Darche.

Com cerca de 68 quilos de material sustentável, o 208 Natural possui rodas de alumínio de 17 polegadas que receberam um tratamento de superfície conhecido como "anodine", aplicado nas partes externas das aeronaves. O banho de anodine, segundo Darche, além de deixar o material mais resistente, torna o alumínio menos permeável ao ar, garantindo melhora no consumo de combustível.

O monograma aplicado na parte traseira do carro tem desenho inspirado no pau-brasil, árvore que é parte do projeto de reflorestamento promovido pela Peugeot na Fazenda São Nicolau. A peça, segundo a montadora, foi produzida na base de uma chapa laminada de bambu e recortada com tecnologia a laser.

No interior do carro, um dos destaques é o para-sol em jornal reciclado transformado em um material parecido com madeira. Darche ressalta que o trabalho foi desenvolvido em parceria com um grupo de artesãos do projeto social Rede Asta, do Rio de Janeiro. A peça recebeu uma selagem transparente para garantir mais proteção ao produto final.

O couro de Pirarucu, um dos maiores peixes de água-doce do mundo, originário da Amazônia, deixou de ser privilégio do mundo da moda no país. O material, na cor marrom, foi aplicado de maneira decorativa nos bancos do carro, além de revestir detalhes do painel de instrumentos e os apoios dos braços das portas. O couro de salmão foi utilizado no freio de mão e na alavanca de câmbio.

A parte interna do teto foi revestida em cortiça tingida na cor salin. Por suas propriedades térmicas e acústicas, a cortiça foi utilizada por ser excelente isolante. Os tapetes do carro usam um misto de elementos, como silicone, cortiça, couro bovino natural e o laminado de bambu tingido.

O carro impressionou a matriz da Peugeot e a parceira com a Embraer deve prosseguir. "Já temos discussões sobre a continuidade da parceria, pois o objetivo é juntar forças que possam ser aplicadas em soluções globais para a indústria automotiva e aeronáutica", ressaltou Frederico Battaglia, diretor de marketing da Peugeot no Brasil.

Para a Embraer, o benefício da parceria, segundo o vice-presidente de Relações Institucionais e Sustentabilidade, Nelson Salgado, é o complemento das pesquisas desenvolvidas pela empresa, através da utilização prática dos materiais no carro conceito. O intercâmbio de conhecimentos e de profissionais entre a indústria aeroespacial e automobilística, de acordo com o executivo, sempre existiu, mas é a primeira vez que se faz o desenvolvimento conjunto de um carro-conceito.

A maioria dos materiais utilizados no carro saiu do laboratório de desenvolvimento de conceitos de materiais da Embraer. O laboratório tem a função de estimular a cultura de exploração de materiais de baixo impacto ambiental (metais, cerâmicas, polímeros, produtos têxteis e compósitos) ainda não disponíveis no mercado.

"Não temos conhecimento de nenhuma outra biblioteca de materiais naturais tão completa quanto a nossa", disse. As pesquisas da empresa com materiais sustentáveis para interiores de avião começaram em 2007, como oportunidade para usar elementos nacionais no interior dos jatos executivos. Os materiais utilizados no 208 Natural ainda não foram aplicados nos aviões, mas podem ser empregados nas futuras gerações de aeronaves.

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Aerocarros a caminho

04/10/2014 - Revista Planeta


Nas primeiras décadas do século XX, ter um automóvel era sinônimo de liberdade para ir aonde se quisesse, numa época em que poucas pessoas podiam se dar a esse luxo. Um século depois, a indústria automobilística é uma potência global, ter carro é corriqueiro e só a cidade de São Paulo, com 11 milhões de habitantes, possui 7 milhões de veículos registrados.

Com uma frota dessas não há melhoria no transporte coletivo urbano que dê conta de destravar o trânsito como nos velhos tempos. Daí a projeção de um outro sonho, restrito novamente a privilegiados: ter um veículo que trafegue por terra e ar, passível de ser guardado na garagem e decolar ou pousar sem necessidade de pistas. Em termos de sonho, não chegamos à era da família Jetson, mas estamos a caminho.

"O benefício potencial de um carro voador prático é tremendo. Pelo menos 6% dos americanos desejam um, 19 milhões de pessoas", afirma Carl Dietrich, presidente da empresa americana Terrafugia. Baseada em Massachusetts, a companhia está na dianteira do setor com o aerocarro Transition, criado em 2006, considerado apto para trafegar nos EUA, no ano passado, tanto pela Federal Aviation Administration quanto pela National Highway Traffic Safety Administration.

O Transition chegará ao mercado em 2015 depois de mais testes. O veículo ainda exige pista curta para decolar, mas possui asas dobráveis e pode ser guardado na garagem. O conceito pressupõe rodar até um aeroporto, decolar (com um piloto e um passageiro), atingir 185 km/h de velocidade no ar e voar até mil quilômetros usando gasolina de 91 octanas (equivalente à gasolina premium brasileira). O preço, US$ 300 mil, equivale ao de um Cessna 172, o avião pequeno mais popular do mundo. O custo não chega a ser empecilho para os atuais 100 privilegiados da sua lista de pedidos.

Enquanto o Transition está sendo preparado para a estreia nos EUA – já que nenhum outro país autorizou seu uso –, a Terrafugia já planeja outra novidade avançada: o TF-X, um aerocarro híbrido dotado de asas e hélices dobráveis, desenhado para quatro pessoas (piloto e três passageiros). Seus atrativos são a simplicidade no manuseio e a facilidade para decolar verticalmente, como um helicóptero. Em voo, as hélices são recolhidas e um motor de 300 hp propulsiona o aparelho, que atinge a velocidade de até 320 km/h. O veículo deverá atender a preocupações especiais com segurança, como paraquedas de emergência e sensores automáticos para evitar tráfego aéreo, mau tempo e espaços restritos a aeronaves maiores. Mas ainda deverá enfrentar uma bateria de testes rigorosos e problemas regulatórios.

Segundo Dietrich, "aprender a operar o TF-X com segurança não tomará mais de cinco horas de um motorista mediano". Prevê-se que o projeto fique pronto em 2025, a um preço unitário "comparável ao dos mais luxuosos carros atuais", promete o executivo.

Mercado lento

Quem está mais próximo da Terrafugia no novo mercado é a PAL-V, da Holanda, que planeja lançar um carro-helicóptero em 2016. O modelo PAL-V One, com hélices dobráveis, pode levar o piloto e um passageiro à velocidade de 180 km/h tanto no ar quanto em terra, com autonomia de combustível para voar 500 km e rodar 1.200 km. O preço calculado é indigesto: 500 mil euros (cerca de US$ 676 mil). Apenas 45 unidades deverão ser postas inicialmente à venda.

"Não esperamos vender milhões, levará tempo para desenvolver esse mercado", afirma o engenheiro- chefe Mike Stekelenburg. A aposta é comercializar 600 veículos por ano, por enquanto. Terrafugia e PAL-V investem num mercado que ainda não dispõe de regulação. Por enquanto, os projetos de aparelhos aparecem em peças publicitárias, voando sobre cidades ou campos verdejantes. Mas como seria se milhares de veículos desse tipo viajassem ao mesmo tempo rumo a um estádio de futebol ou um shopping center? Como organizar esse tráfego? Os pilotos precisarão de carteira de motorista e de brevê?

Normas estritas do trânsito e de pilotagem terão de ser estabelecidas. Nesse sentido, cinco instituições de pesquisa da Inglaterra, Suíça e Alemanha já estão trabalhando no projeto myCopter, que conta com um subsídio de US$ 4,7 milhões da União Europeia: Universidade de Liverpool, Escola Politécnica Federal de Lausanne, Instituto Federal Suíço de Tecnologia de Zurique, Instituto Max Planck de Biologia Cibernética e Instituto de Tecnologia de Karlsruhe.

O objetivo da iniciativa conjunta é estudar o ambiente de voo e preparar os indivíduos para conduzir os aparelhos, tornando a pilotagem o mais fácil possível. Para tanto, as instituições criaram simuladores e veículos aéreos de teste em terceira dimensão. Os resultados obtidos ajudarão a aprimorar a interface homem-máquina e compreender os problemas regulatórios, além de favorecer o surgimento de melhorias técnicas nas aeronaves.

"Nosso objetivo é desenvolver tecnologias que poderão ser usadas para formatar um novo sistema de transporte para viagens pessoais, na verdade uma nova modalidade de tráfego, levando em conta a expectativa dos usuários e a reação do público", sintetiza Heinrich Bülthoff , do Instituto Max Planck. Dadas as condições precárias do trânsito em muitas cidades, doses extremas de cautela serão necessárias.